Blog sobre Moçambique

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Bancarização da Economia de Moçambique – uma contribuição para o debate

A Bancarização da economia de Moçambique é um dos principais desafios dos agentes implementadores de políticas Monetárias e financeiras em  Moçambique, nomeadamente o Banco de Moçambique, os Bancos comerciais e outras instituições financeiras a operar no País. Alguns intervenientes do sector financeiro Moçambicanos defendem que o fraco desenvolvimento de infra-estruturas constitui um dos principais entraves à bancarização da economia, ou seja à expansão dos bancos e instituições financeiras às zonas rurais, o aumento do número de balcões e de ATM´s. tive a oportunidade de participar num debate promovido pela estação televisiva STV, no Programa O País Económico, sobre a bancarização da economia de Moçambique, no qual participaram o Dr. Sérgio Viéira, ex-Governador do Banco de Moçambique, o Dr. Lourenço Veniça, economista e docente na Faculdade de Economia da UEM, e achei por bem trazer uma contribuição para o debate.

O Banco de Moçambique considera-se satisfeito com a expansão da banca para as zonas rurais de Moçambique, um desafio que já vem desde o ano de 2007, com uma cobertura actual de 51 distritos, dos 128 existentes no País, ou seja, existem ainda 77 distritos em Moçambique sem nenhuma sucursal ou Banco a funcionar localmente.  Provavelmente a satisfação do Banco Central Moçambicanon resida no facto de dos 28 distritos abrangidos em 2007 agora em 2010 o número de distritos ter aumentado para 51, ou seja, terem sido abertos bancos em mais 23 Distritos nos últimos dois anos em Moçambique. Portanto, a taxa de cobertura passou de 22% para 40%.

A deficiência de infra-estruturas tais como estradas, electricidade, telecomunicações e outras representa um dos maiores entraves à expansão da banca Moçambicana para as zonas rurais, pois grande parte dos distritos em Moçambique regista ainda estas deficiências. A questão das infra-estruturas é pertinente, mas a questão que se coloca é: será que com a existência de infra-estrurtura a bancarização da economia de moçambique deixará de ter as dificuldades que hoje enfrenta ?

A Bancarização da economia de Moçambique, realizada nos actuais moldes só permite que os principais agentes desta medida de política de desenvolvimento económico e financeiro sejam os bancos comerciais e instituições financeiras do sector privado. Ao Banco Central (Banco de Moçambique) cabe apenas o papel de exercicio da persuação moral, ou seja, apelar para que o sector privado ganhe uma nova atitude em relação à bancarização. Logo, não há condições para que o Estado lidere a bancarização da economia e a expansão bancária.

O sector privado procura mercados competitivos e rentáveis, procura espaços onde a demanda pelos seus produtos e serviços é elevada, procura lucro e rentabilidade. Não interessa aos Bancos comerciais abrirem balcões onde não haja infra-estruturas, e mais do que isso não lhes interessa abrir balcões onde o seu principal negócio (dinheiro) não rende juros. Por isso é que mais balcões continuarão a ser abertos em zonas urbanas e em zonas com maior fluxo monetário e financeiro.

Mesmo na capital de Moçambique, a cidade de Maputo, existem bairros e distritos Municipais com todas as infra-estruturas necessárias para a criação de um banco, mas que simplesmente não tem nenhum balcão ou agência bancária por perto, o que significa que para o sector privado, para a banca comercial, não bastam apenas infra-estruturas, é preciso outro tipo de dinâmicas de circulação de moeda, de existencia de investidores, de existencia de mercados financeiros competitivos e lucrativos.

Se a expansão dos serviços financeiros para as zonas rurais é um desafio de política económica e financeira, então é necessário que o Estado moçambicano, para além do estabelecimento de infra-estruturas, lidere o processo levando à cabo algumas inciciativas tais como a introdução de medidas fiscais que beneficiem a expansão bancária, com a introdução de subsídios a determinados serviços bancários nas zonas rurais, ou com e entrada directa do Estado, através de um Banco ou instituição que tenha o desafio de liderar a captação de poupanças nas zonas rurais. Os indivíduos das zonas rurais são cidadãos de baixa renda que precisam de fazer pequenas poupanças e precisam de financiamento para pequenas actividades de geração de rendimento.

Estes cidadãos precisam de 100 USD para iniciarem um pequeno negócio, seja a criação de aves, seja a venda de produtos alimentares básicos, seja para a compra de uma bicicleta-taxi, seja para a montagem de um telefóne público, dentre outras actividades económicas rurais e de pequena dimensão que contribuem para reduçao da pobreza dos mesmos. Há exemplos no continente africano e no mundo (em países ricos e pobres) de experiências de bancos de poupança e crédito para indivíduos de baixa renda que resultaram em sucesso.

Ainda existe a opção do incentivo ao micro-crédito e as micro-finanças em Moçambique, no entanto o que se apercebe é que continua-se no ciclo da falta de infra-estruturas, falta de pessoal qualificado nos distritos, alto risco de concessão de crédito, entre outros. As instituições de micro-finanças seguem o mesmo percurso que os bancos comerciais.

Indirectamente há um sinal do Governo Moçambicano, através da institucionalização dos Fundos de investimento em Iniciativa Local (FIIL) ou Orçamentos de investimento em iniciativas Locais (OIIL), os conceituados “7 milhões” para fazer face ao fraco crédito e financiamento ao desenvolvimento nos distritos, mas ainda falta a componente de captação de poupanças dos indivíduos, de modo a que estas poupanças nas zonas rurais não fiquem enterradas ou guardadas em residencias, mas em lugar seguro e que produz efeitos multiplicadores na economia.

Vale a pena ler alguns escritos mais elaborados relacionados com  bancarização da economia de Moçambique publicados em Moçambique por Salim Vala, Director no MPD, Antonio Matabele, economista Moçambicano, pelo Banco de Moçambique e um debate sobre o assunto no blog do Julio Mutisse,  e dai tirar ilações sobre este tema que se afigura importante para a economia de Moçambique.

8 comentários:

Bayano Valy disse...

basílio
fica mal postares e ninguém responder. sou leigo na matéria mas para não deixar o mote que deste aquí caír no esquecimento vou tentar responder ao teu desafio.

já é bom que tenhas alertado sobre o facto de que não hão de ser as infrastructuras que irão atrair a banca privada a abrir balcões nas zonas rurais devido à fraca renda dos camponeses. ao meu ver, apesar de terem parcos rendimentos os camponeses precisam de criar poupanças e o estado precisa dessas poupanças.

aqui surge a questão de como conseguir que o pouco dinheiro que os camponeses têm entre no sistema financeiro. abrir um balcão custa muito dinheiro que certamente não será compensado pelas poucas poupanças dos camponeses.

ora, um dos nossos grandes problemas é talvez desprezarmos o que foi feito em outros períodos da nossa história. no período colonial, o problema com que hoje nos debatemos existia mas colono captava essas poupanças. como? a banca entrava em acordo com o "lojista" que mediante um certo fee captava as poupanças dos farmeiros e camponeses. o que nos custa usar o mesmo sistema onde existem lojas. começa-se por oferecer-se serviços de depósitos à longo prazo e depois vão-se expandindo - penso que o que importa é formar o lojista a efectuar a operação (ninguém vai certamente me pagar pela consultoria).

mas se queremos progredir e expandir os serviços para todos os distritos temos que começar a pensar fora da caixa. o grande problema parece ser de pensarmos que banco tem de ter infrastructura.

aquel abraço

Basilio Muhate disse...

Caro Bayano

Que fique desde já claro que eu não posto para ser respondido, nem qualifico o meu blog pelo número de comentários, por isso para mim não fica mal que ninguem responda ao meu post. Cada cidadão pode criar um blog atras de um objectivo por si traçado.

Indo ao debate, As infra-estruturas atraem a expansão bancária sim, não podemos recusar este facto, mas há outros factores que na minha óptica são os mais determinantes para a expansão dos bancos privados as zonas rurais, como eu bem me referi no texto.

O Ponto que colocas é pertinente: necessidade de captação, pelo sistema monetário e financeiro, de poupanças de indivíduos residentes nas zonas rurais e de indivíduos de baixa renda.

Pouco depois da independência Nacional o BPD desempenhou um papel importante na bancarização da economia, num contexto de economia centralmente planificada, com os Correios de Moçambique a servirem de parceiros na captação de poupança dos Moçambicanos. Precisamos de saber porque é que os correios deixaram de lado esta parceria de desenvolvimento do sector bancário Moçambicano, se pela mudança para uma economia de mercado ou devido a situações internas da própria empresa Correios de Moçambique.

Pensemos fora da caixa, nos lojistas, por exemplo, na banca móvel por exemplo, mas enquanto estas notas e moedas em circulação na posse dos indivíduos estiver fora de controle do sistema financeiro, vamos continuar a dar força a agiotagem, a moeda enterrada, guardada por debaixo do colchão, etc., o que não é seguro e nem contribui para a preservação e valorização do metical.

Anônimo disse...

Basilio,
O tema é muito interessante mas eu acho que, a bancarização só tem sentido quando a associada a poupança. Infelismente poucas pessoas tem o hábito de poupar. Conheço muitos amigos pessoais que para além da canta-salário que o empregador abriu para eles, não têm nenhuma outra conta onde eles possam poupar, nem que seja para deixar 200 Mt/mês.

para mim o maior problema está na cultura de poupança, numa altura em que nós sabemos que as grandes economias servem-se das poupanças dos seus cidadãos.

A minha avô em Cambine deixa algumas moedas na almofada, outras enterra mas será isso que vai justicar a existencia de um banco? Outros dizem que não serão as poupanças de camponeses que clamam pelo Banco mas sim a dos comerciantes. Até pode ser verdade, mas quantos comerciantes estão em Funhalouro. é sujsstentavel deixar uma dependencia do Bim naquele distrito. Acho que não.

Eu sei que a existencia de um banco perto de nós pode estimular poupanças mas não suficientes para justificar a presença de uma dependencia.

Em outros países existem as experiencia de dependencias móveis, me parece uma saida sustentavel e que talves possa servir entre nós. Por exemplo, a dependencia de Massinga teria que ter brigadas móveis que serviriam Funhalouro, Morrumbene etc.

Simples mawonela (opinião) que é muito influenciado pelo virus da Gestão que me atormenta maningue

Jorge Saiete

Bayano Valy disse...

@ basílio,
os comentários também são necessários pois mostram que as pessoas nos lêem e têem opinião sobre o assunto por nós despoletado. aliás, isso faz-nos medir o pulsar da nossa sociedade intelectual e não só.

bom o ponto que colocas é pertinente. o que aconteceu às parcerias entre os correios com os bancos? ao meu ver, tudo radica do facto de se olhar para moçambique como maputo a restantes cidades. o camponês se quer vender ou comprar dinheiro que gaste dinheiro no transporte; parece ser esse o lema. garanto-te que se um banco de repente decidir aplicar as ideias aqui discutidas todos os outros irão a correr. o engraçado é que os camponeses têem muito dinheiro fruto das suas campanhas de comercialialização. da próxima vez que m cruzar com o tomáz salomão vou-lhe colocar a questão e ouvir da sua justiça.

@ saite
a tua avó coloca o dinheiro no travesseiro porque não encontra resposta; se existisse um banco por perto de certo iria depositar lá. como a tua avó quantos outros não depositam o dinheiro nas suas almofadas?

sim, não temos cultura de poupança, mas o engraçado é que durante a vigência do bpd fazia-se muita poupança. o que terá acontecido para alterar este cenário? e se não poupamos, porquê não gasta algum em campanhas de sensibilização para a poupança ao invés de se patrocinar pandzas e outras mediocridades?

Veiga disse...

Amigo:
Embora desenquadrado do tema, aproveito para desejar Boa Páscoa
António Veiga

Veiga disse...

Hoje enviei para todos os blogs que sigo este comentário para reflexão:A história é uma galeria de quadros onde há poucos originais e muitas cópias O 25 Abril de 1974 sendo uma revolução pintou com cravos um marco na história mundial como um movimento pacifista conseguindo mudar as ideias e o rumo dum povo em busca dum sonho. É um sonho inacabado mas será sempre um sonho de liberdade e democracia. e homens libres são aqueles que não receiam ir até ao fim da sua razão. Abaixo deixo o link da música que operacionou no dia da revolução dos cravos, vale a pena pela musicalidade, espero que gostes!
http://www.youtube.com/watch?v=ci76cKwFLDs

Leonardo Mello disse...

Não é necessário investir em unidades bancárias em comunidades rurais para se obter "um banco" naquele local. Casos no livro A Riqueza na Base da Pirâmide (http://goo.gl/Z7y8) mostram claramente isso: que apenas o incentivo à confiança das pessoas, através do treinamento de agentes locais, já é suficiente para movimentar a economia, mesmo que de forma tímida a princípio.

Mulheres em comunidades são treinadas pelos bancos para formar "grupos de investimento", onde elas mesmo decidem quem terá a prioridade e quanto será emprestado para a compra de pequenos itens, como sacos de cimento ou tijolos para uma construção. Há bancos que ganham muito com o micro-crédito, recebendo juros altos, só que em pequenos valores por vez.

Anônimo disse...

muito obrigaado pela materia que postou. pois eu estava mesmo a procura deste para incrementar o meu trabalho de pesquisa na cadeira de Economia Politica. continue assim.