Blog sobre Moçambique

sexta-feira, 25 de junho de 2010

35 anos de Independencia: O PERCURSO DA ECONOMIA DE MOÇAMBIQUE


Moçambique celebra hoje 35 anos de independência Nacional e importa referir que a economia de Moçambique floresceu durante este percurso, pese embora a Guerra de desestabilização tenha constituído um dos maiores entraves ao crescimento e desenvolvimento económico do País ao longo deste período. O Acordo de Paz, em 1992, permitiu que Moçambique registasse taxas de crescimento económico que constituíram referência internacional e registaram-se melhorias significativas dos padrões de vida dos Moçambicanos nos últimos 18 anos. Não há dúvidas que persistem desafios ao desenvolvimento do país, na coordenação e implementação de políticas, e na concentração do focus da economia na base produtiva.
Logo após a independência, a economia de Moçambique estava praticamente ligada ao modelo de gestão económica colonial, e a saída de recursos humanos, materiais e financeiros para a "metrópole" deixou a nova liderança política fragilizada e com a necessidade de iniciar um novo processo de reestruturação económica do País. Foi assim que a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), adoptou a partir de 1975 medidas económicas tais como as nacionalizações, o encerramento das fronteiras com a Rodésia, a Adopção do Plano Prospectivo e Indicativo (PPI), dentre outras medidas de centralização da economia.
Os primeiros sinais de recuperação económica poucos anos após a proclamação da independência, com o apoio de países socialistas como a URSS, China, Cuba e Argélia foram seguidos de uma profunda crise no princípio da década 80, caracterizada pelo declínio da produção agrícola e industrial em mais de 20%, depreciação do metical, redução das reservas alimentares e financeiras, e um decréscimo das exportações do País. As nacionalizações e o controlo, pelo estado, das principais empresas produtivas do País e a adopção de um modelo de economia centralmente planificada retraiu o investimento estrangeiro e como o país não dispunha de capital humano suficiente, a gestão destas empresas não foi satisfatória durante o período. Esta situação levou a um deficit do PIB de cerca de 15%.
Este cenário levou a que o Governo Moçambicano aderisse, em meados da década 80, às instituições de Bretton Woods, nomeadamente o Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial (BM) , e adoptou novos programas de ajustamento estrutural da economia (PRE, PRES) e mais tarde até 1992 uma série de medidas de política económica fossem tomadas, nomeadamente a aprovação de uma nova constituição, a mudança do sistema de economia centralizada para uma economia de mercado, com abertura ao livre comércio, a reestruturação e privatização de empresas Estatais. Como resultado, o PIB voltou a mostrar sinais de crescimento a partir de finais da década de 80.

Do Acordo de Paz em diante

No entanto, o País continuava a registar uma fraca integração de mercados e da economia, assim como infra-estruturas económicas e sociais em constante degradação devido à guerra de desestabilização. Em 1992 é assinado o Acordo Geral de Paz que põe fim a 16 anos de guerra civil no País e permite uma maior circulação de pessoas e bens em todo o território nacional. Este acordo permitiu que fosse desenhadas novas políticas e programas que permitiram que nos anos subsequentes fosse possível a construção e reconstrução de infra-estruturas, a expansão da distribuição de bens e serviços aos cidadãos, a reforma do sector público, a recuperação da industria e da agricultura, dentre outros factores de crescimento e desenvolvimento económico.

O PIB vem crescendo a taxas favoráveis nos últimos 5 anos, ou seja, entre 8% a 9% ao ano em média. A partir de meados da década de 2000 iniciou uma nova fase na dinâmica de crescimento da economia Moçambicana, através da captação de mega-projectos de investimento, com destaque para Mozal, Sasol, HCB, Vale, Riversdale, Areias Pesadas de Moma, dentre outros, que constituem uma forte alavanca no crescimento económico e na geração de postos de trabalho. Por outro lado, o Governo Introduziu o Fundo de Investimento e Iniciativa Local (FIIL) para potenciar a base produtiva da economia e financiar directamente os agentes económicos que actuam nos distritos do País, nas zonas rurais, na produção de alimentos e na criação de postos de trabalho.

Ainda há muito diamante

Se tomarmos em consideração o percurso da economia de Moçambique nos últimos 35 anos podemos afirmar que ainda há muito "diamante por lapidar" para o desenvolvimento do País. As taxas de crescimento económico satisfatórias mostram que é possível assegurar um desenvolvimento económico próspero nos próximos tempos em Moçambique, mas para tal é necessário tomar-se em consideração alguns elementos:

Maior coerência e integração de políticas, programas e acções de desenvolvimento económico a estratégia de desenvolvimento do país deve estar bem definida e evitar no máximo distorções sectoriais, ou seja, todas as políticas económicas devem almejar o mesmo objectivo comum seja ele a redução da pobreza, ou o incremento do PIB per-capita, ou o crescimento económico. Verifica-se que ainda persistem lacunas de coerência e integração na formulação e implementação de políticas de desenvolvimento. A título de exemplo existem três grandes corredores de desenvolvimento horizontais e paralelos (norte, centro e sul) e nestes 35 anos ainda há necessidade de um corredor potenciado norte-sul para fazer a integração inter-regional de Moçambique. Este é um desafio para os próximos anos no âmbito da integração.
Será necessário que a planificação do desenvolvimento económico busque as combinações de políticas fiscal e monetária e as ajuste mais gradualmente à realidade de crescimento e desenvolvimento que se pretende alcançar no País. A expansão do sector e dos serviços financeiros no país deverá acompanhar a evolução da produção e do sector real da economia. O Governo e o Banco Central devem incrementar o diálogo nos próximos tempos.

Investimento em Infra-Estruturas

A existencia de infra-estruturas continua a representar uma condição para o crescimento e desenvolvimento de economias como a Moçambicana. Estradas, Vias-férreas, pontes, fábricas, comunicações, energia eléctrica, recursos hídricos, Aeroportos, etc., continuam a ser necessários em Moçambique. As infra-estruturas existentes ainda estão aquém de cobrir as necessidades de desenvolvimento que o país impõe, apesar dos avanços significativos que se registaram nos últimos 35 anos. Será importante financiar infra-estruturas de apoio à produção agrícola e industrial para o aumento da produção e das exportações.
Nos Sectores de sucesso e mega-projectos Será necessário visualizar e potenciar os sectores mais competitivos e lucrativos da economia mundial nos próximos tempos, nomeadamente a extracção mineira, a produção de energia, o turismo com um enorme potencial por explorar, e as telecomunicações. A Evolução destes sectores demonstra que têm enorme potencial nos mercados interno e internacional e geram economias de escala, por isso os agentes e os fazedores de política económica deverão olhar para estes sectores de modo a buscar mais-valias e parcerias externas que possam trazer vantagens para os Moçambicanos.

 
Na agricultura quanto maior for a contribuição da agricultura no PIB de Moçambique, mais eficaz será a redução da pobreza no País.Sendo a base de desenvolvimento da economia de Moçambique, segundo a constituição, e sendo o sector produtivo onde se concentra a maior parte da população Moçambicana, nunca deve ser terciarizada ou negligenciada pois é deste sector que o rendimento disponível da maioria das famílias Moçambicanas depende. Será importante um grande investimento e intervenção na Revolução Verde e nos diferentes programas de desenvolvimento da agricultura, mas a ideia central deve ser tirar gradualmente o pequeno agricultor familiar Moçambicano de uma situação de subsistência para níveis mais elevados.


Fortalecimento de pequenas e médias empresas - É importante potenciar o pequeno e médio empresário Moçambicano através da criação de uma rede consolidada de pequenas e médias empresas, de modo a que a riqueza seja melhor distribuída, e que haja mais postos de trabalhos para os cidadãos. A estratégia de desenvolvimento de pequenas e médias empresas deverá ser potenciada no recém-criado Instituto para Promoção das Pequenas e Médias Empresas de Moçambique (IPEME).

O desenvolvimento de Moçambique passa pelos grandes projectos como a Ponte Armando Guebuza, sobre o Rio Zambeze, maior obra desde a independencia nacional, ou a ponte sobre o rio Rovuma, dentre outros, mas o País precisa de sair da situação de pobreza em que se encontra com os recursos de que dispõe. Isto significa que mesmo que as empresas cresçam, os bancos cresçam, os mega-projectos gerem lucros, e que haja mais infra-estruturas, é preciso assegurar que os Moçambicanos fiquem mais ricos e menos pobres.

Basílio Muhate in Caderno de Economia & Negócios, Jornal notícias 25/06/2009

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Sobre a Dolarização da Economia de Moçambique - Bruno Almeida

Depois de umas "férias" na blogosfera, estou de volta, ainda na ressaca e um pouco desactualizado das últimas evoluções nesta rede social. Alguns emails que me cairam no correio electrónico questionavam se eu tinha "desistido" de blogar sobre a economia de Moçambique.... 
Volto com a entrevista que o meu amigo e consultor Bruno Almeida concedeu recentemente abordando a Dolarização da Economia no caso de Moçambique. foi a melhor maneira que encontrei para voltar, mesmo que ainda consumido pela ressaca das "férias"...
Vale a pena ler...

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BRUNO ALMEIDA FALA SOBRE A DOLARIZAÇÃO DA ECONOMIA MOÇAMBICANA

1.       Até que ponto a “dolarização” da economia é grave, considerando o caso de Moçambique?

A dolarização da economia moçambicana, como qualquer outro fenómeno que mexe com a nossa identidade, é muito preocupante, e há necessidade eminente de se combater este fenómeno. No entanto, este combate apresenta algumas medidas restritivas que podem colocar em perigo o curso normal da economia. Tal é o caso da restrição à moeda estrangeira que dá mais azo ao mercado paralelo. Moçambique tem envidado esforços para combater este fenómeno. O facto é que os nossos empresários atrelam-se à uma moeda de referência, neste caso o dólar, devido a conjuntura económica do nosso país, em que ainda não temos uma moeda forte capaz de competir com as outras. Nós dependemos em mais de 50% de importações, temos que ver esta questão com muito cuidado.


2.       O nosso país encontra-se numa situação de “desdolarizar” o mercado?

Desdolarizar? Temos estado a fazer há anos. Impossível é tomarmos medidas drásticas e com efeitos imediatos em relação a este aspecto. Já referi que nós dependemos em mais de 50% de importações, é preciso ter cuidado com políticas drásticas em relação a desdolarização. Veja, se o Sr. é empresário e toda a matéria-prima para sua indústria é importada, imagina quantos milhares de meticais teria de gastar para pagar a devida importação se estivesse numa situação em que não teria a divisa para o devido pagamento? Uma vez que a nossa moeda ainda tem um peso reduzido em relação as outras moedas internacionalmente fortes.
Temos que fazer as coisas com calma, a desdolarização tem que ser gradual e sustentada, paralelamente, com o aumento da produção, com a abertura de mais indústrias no país, com uma boa gestão das indústrias já existentes, etc.

Pese embora a tendência do nosso mercado seja um pouco controversa, pois parece estar a ficar moda fixar a maioria dos preços em moeda estrangeira.

3.       Que impacto é que tem a violação da medida que obriga a fixação dos preços e da facturação em moeda nacional?

Do lado da economia/nação o impacto é claro:
·         Perda de parte da nossa identidade. A moeda é o símbolo da soberania de uma nação, é o símbolo da nossa identidade;
·         Dificulta o controlo e a estabilidade dos indicadores macroeconómicos (inflação, taxa de câmbio entre outros)
·         Aumenta os custos de transacção para as empresas e os seus clientes, a medida em que tudo deve ser feito em metical e depois convertido em dólar.

NB: Adicionalmente leva-nos a perda de identidade da nossa moeda, remetendo-nos a falta de auto-estima.

Do lado dos empresários, o facto é que um dia serão penalizados por esta violação as regras estipuladas.

4.       Há países que mesmo usando o dólar tem uma economia forte e competitiva. Porquê, precisamos ter uma moeda forte para desenvolver?

Durante anos o dólar foi a suprema moeda de reserva e de comércio. É uma moeda extremamente forte. Esses países certamente que tem níveis de produção altamente elevados e as exportações são significativas, que não é o nosso caso. Uma das funções da moeda é a de meio de troca. Se o meio de troca não é poderoso em relação a valor do bem/serviço que se pretende, temos que gastar mais unidades do tal meio de troca (moeda-metical) para poder adquirir o determinado bem. Daí que há necessidade sim de ter uma moeda forte para desenvolver, não obstante o facto de uma moeda forte atrair o investimento. Pois, os investidores estarão seguros de que não estarão a investir os seus activos numa economia que os poderá desvalorizar com facilidade.

5.       Alguns círculos sugerem que o Banco de Moçambique está a desvalorizar o Metical para atrair as exportações, abaladas pela crise financeira o ano passado. Acha que este argumento é válido?

Sou céptico quanto a esta assumpção. Pode ser e pode não ser. Melhor opinião só poderá vir do Banco de Moçambique.

Todavia, importa-se referir o seguinte. O Bancos Centrais, por vezes ao pretenderem estimular as exportações dos respectivos países podem depreciar a sua moeda (aumentando a taxa de câmbio) por um determinado período de tempo.

Obviamente que existem outros métodos para estimular as exportações:


·         Temos que construir relacionamentos. Outros países têm hábitos e culturas diferentes, e uma boa relação com importadores pede uma dose de conversa e mente aberta.
·         Temos que personalizar os produtos. Fazer uma pesquisa de mercado para modificar os itens que pretendemos vender, de acordo com as normas do país de destino;
·         Etc

O importante seria primeiro entender se Moçambique exporta porque o produtor vende no exterior ou porque o importador vem comprar no nosso mercado? É discutível.

6.       Neste ponto, gostaria que acrescentasse outros aspectos que julga importantes.

Possivelmente a nossa legislação poderia abrir uma excepção para algumas entidades. Note que somente empresas que detém maior parte das suas transacções relativas a compras de insumos com o exterior é que se justifica a dolarização dos seus serviços, para evitar incorrerem em prejuízos acumulados, decorrentes das flutuações cambiais.

Caso contrário é absurdo! Valorizemos a nossa moeda, usemos o metical... É orgulho moçambicano. É símbolo da nossa identidade.


Bruno Almeida In "O País"